é papel seu ou impressão minha?

às vezes, me pego pensando no que as pessoas acham de mim. não de forma ansiosa, como quem pensa em definir a si com base nas opiniões dos outros, mas de forma curiosa, como quem obtivesse o poder de ler mentes por um breve instante. poder esse, específico, capaz de ler aquele exato pensamento em que meu nome é mencionado; o contexto, a opinião e a conclusão. penso se vale a pena descobrir o universo que eu não faço parte. descobrir o que acontece quando eu não posso olhar, quando eu não posso ouvir, quando eu não consigo saber. ouvir os "é, ele sempre foi assim", os "não adianta, do jeito que ele é" e os "tu sabe dele? ele é um". penso se isso me faria descobrir exatamente a impressão que eu causo. se a pessoa me achou engraçado porque pegou o timing perfeito da minha piada. se me achou lindo porque olhou pelo ângulo que eu faço questão de mostrar. se me achou simpático porque eu fiz questão de escutar. o que faz diferenciar a impressão de um causador com quem a recebe?

eventualmente tenho certeza do que sou, do que sou capaz de fazer e como posso amar. nessas horas, sei exatamente a impressão que passei, mas talvez não tenha certeza do tipo de folha em que saí. talvez meu conteúdo tenha sido perfeito, mas a tinta tava falhando, o papel era daqueles reciclado, e o barulho da impressora era infernal. era pra ter saído colorido, mas não tinha comprado o cartucho necessário. como vou saber se fui o suficiente, se a nossa conexão se perde pelo caminho? como wifis, quantas paredes atrapalham nosso sinal? não sei se tu ouve o mesmo que eu digo, se tu lê o mesmo que eu escrevo, se tu sente o mesmo que eu sinto.

concluo que, mais uma vez, não consigo controlar o que já saiu de mim. só o que posso fazer é então perguntar: como você, que me lê, vai lembrar de mim? que tipo de amor tu acha que eu transpiro através dessas palavras? pra uns, vai ficar a lembrança de um abraço apertado ou uma bebida comprada, talvez um beijo estralado. pra outros, um texto bem lido ou um 'eu te amo' chorado, talvez uma música dedicada. que tipo de papel, marca de cartucho, modelo de impressora, cor de tinta e número de páginas tu supõe ao receber a impressão de alguém? quantas cópias dela tu distribui adiante? quantas pessoas te escaneiam?

no final, imagino quantas páginas tem meu livro na tua estante. quantas camadas minhas na tua cebola. quantos decibéis tem minha voz no teu pensamento. quantas memórias e sonhos teus eu apareço. mas nada disso importa, porque não tenho poder algum. se tivesse, descobriria o tamanho do meu amor pelo mundo. o tamanho das minhas flores em cada jardim. o que fica é a incessante vontade de plantar cada vez mais. escasso e esporádico, escrevo excertos que extraiam emoção, expondo excessivamente, esperando esplendores em elusivos eus, vocês.

Comentários

  1. Tudo o que eu precisava ler, nem uma palavra a mais, nem uma a menos!
    Com toda certeza a vida não é fácil, ela é uma impressora que funciona quando quer, mas vale a pena cada impressão 🤍
    Lembrando que: até uma impressão ruim serve pra rascunho.

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  2. Amo te ler! <3 Por mais breve que às vezes eu sinta que tua presença seja na minha estante, ela sempre mostra-se uma leitura reconfortante e cheia de emoção!

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