Perspectivas

  segui fielmente a profecia que eu mesmo me impus em sobre não calar o peito; acreditei que meus textos estavam ligados proporcionalmente à minha vida amorosa e que por isso não escrevia. como se só soubesse falar sobre isso, não abria mais meu blog e achava que não tinha mais o que precisava pra me inspirar. ousei concluir que eu não sabia mais amar. por não me apaixonar por alguém, não me sentia mais capaz de escrever sobre as paixões diversas da vida. senti vários nãos na minha jornada, impostos por mim mesmo. eu ainda os sinto, cada vez que o medo bate e o conforto permanece. cada vez que o sentimento vem e o erro me assusta.

  foi erro grave achar que o amor não existiu dentro de mim. outro foi impor que não amei cada segundo, minuto e hora que passaram durante minha vida toda. sim, o medo de errar me fez tirar conclusões precipitadas - errôneas - sobre as coisas. é claro que eu sinto falta do meu coração batendo mais forte por causa de um outro, mas é ingênuo da minha parte supor que não sou capaz de amar; que não sou forte o suficiente para mover montanhas pelas pessoas que me fazem parte ou chorar junto pelas conquistas alheias.

  engraçado, meus rascunhos falam sobre ausência, sobre o não-sentimento. mas não acho que mudei de conceito. não voltei a amar pois nunca deixei de fazê-lo. o que escrevo aqui não é a falta - é talvez o redirecionamento. a possibilidade sentir o brilho e a química e as borboletas. diferente do passado, agora sofro pela saudade dos rios que me invadiam, me enchiam de algo que nunca fui capaz de concluir o que era. talvez sejam amores diferentes, esses.

  conversando essas noites lembrei o quanto eu me privava de falar e por isso escrevia. demonstração de afeto e carinho era uma expressão rara demais no meu cotidiano. não havia o hábito de amar por voz e por causa disso, amava em parágrafos. eu acumulava os agrados não ditos para explodir nas metáforas de um texto mal formatado. senti que meu amor hoje não é o meu auge, mas é sonoro - minhas ondas encontram o destino, em frequências diferentes dependendo de quantos obstáculos no caminho existirem. talvez sejam barulhentas, mas tento sempre demonstrar no tom adequado, sem desafinar.

  colocava a escrita num local quase tóxico. sentia que precisava falar, sentir o que não me achava permitido e os enigmas aqui expostos eram meu jeito de ser lido. se escrevo hoje é porque não vejo acúmulo, mas ressignificação. não quero esquecer, mas sim celebrar todo o amor, até quando achei que não sentia. se choro com um vídeo caseiro bobo cheio de fotos, é porque o celebro durante esse tempo todo. tempo precioso esse, que me faz entender que o que é bom permanece, mesmo que em memória. não é a toa que gosto de dizer que minha linguagem de amor é tempo de qualidade.

  se despejo perspectivas aleatórias não é porque transbordei, mas entendi que escrever, hoje, não é sobre finalmente conseguir dizer algo. pra mim agora é entender que gosto de expressar minha interpretação sobre algo que me encanta cada dia; entender a conexão que essas palavras têm em outras telas, outros corações. é continuar instigando o que me move, provocando o que me desnorteia.

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